Lolita – Vladimir Nabokov

Tivesse Vladimir Nabokov escrito “Lolita” nos dias de hoje, teria sido censurado, julgado e condenado por apologia à pedofilia. Achei até meio perigoso andar com esse livro debaixo do braço no local onde trabalho. Não fosse eu mulher…

Um romance erótico, pornográfico. Um homem mentalmente doente de meia-idade e uma menina de doze anos.

Não sei se foi Nabokov quem criou o vocábulo “ninfeta”, mas ele dá uma boa explicação: “entre os limites de idade de nove e catorze anos, virgens há que revelam a certos viajores enfeitiçados, bastante mais velhos do que elas, sua verdadeira natureza – que não é humana, mas nínfica (isto é, diabólica). A essas criaturas singulares proponho dar o nome de ‘ninfetas'”.

Em outro trecho ele tenta fazer uma defesa, generalizada (e toda generalização é burra… Ora, esta não é uma?), aos homens pedólifos: “senhoras e senhores membros do júri, quase todos os preferencia sexuais que anseiam por uma latejante relação com alguma menininha (sem dúvida pontuada de ternos gemidos, mas não chegando necessariamente ao coito) são seres inofensivos, inadequados, passivos e tímidos, que apenas pedem à comunidade que lhes permita entregar-se ao seu comportamento supostamente aberrante mas praticamente inócuo, que lhes deixe executar seus pequenos, úmidos e sombrios atos privados de desvio sexual sem que a polícia e a sociedade os persigam. Não somos tarados! Não cometemos estupro, como fazem muitos bravos guerreiros! Somos seres infelizes, meigos de olhar canino, suficientemente bem integrados para saber controlar nossos impilais na presença de adultos, mas prontos a trocar anos e anos de vida pela oportunidade de acariciar uma ninfeta. Positivamente, não somos assassinos: os poetas nunca matam”.

Um verdadeiro advogado do diabo esse Nabokov! O livro não é recomendado em termos morais, mas em termos de texto sim! Nabokovi escreve tão levemente que não dá para sentir as páginas passando aos olhos. É quase autobiográfico e seu estilo me lembra, em algo, Dostoievski.

Uma frase:

… Uma mudança de ares constitui a tradicional falácia a que recorrem os amantes- e os pulmões – condenados.

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A Via Crucis do Corpo – Clarice Lispector

Não dá para conhecer Clarice lendo apenas um livro dela, muito menos “A Via Crucis do Corpo” porque, como ela mesmo disse, na explicação do livro “não faço livros sob encomenda” e acabou por fazer esse, que fugiu a essa regra. 

A forma que ela escreve é um encanto. Não preciso nem dizer que me identifico, não somente por ela ter sido jornalista, mas pela forma de colocar as palavras, de sentir. “Só peço a Deus que ninguém me encomende mais nada. Porque, ao que parece, sou capaz de revoltadamente obedecer, eu a inliberta”.

Para mim, Clarice Lispector está para o “romance” como Florbela Espanca está para a poesia. “Especialistas” não me condenem por essa comparação, sou apenas amante platônica da literatura!

Quando Miss Algrave come camarão e diz “estava tão bom que até parecia pecado”, é uma frase simples e reveladora do quanto a religião destruiu a autoestima da humanidade… Não merecemos o bom? E quando Miss Algrave se descobriu uma mulher que pode sentir prazer? “Ser mulher era uma coisa soberba. Só quem era mulher sabia”.

Em O Corpo, conta a história de duas mulheres que vivem com um homem. As duas resolvem matar o polígamo. Nessa história, Clarice fala de sexo e assassinato com tanta naturalidade, que não dá para achar imoral! É até divertido…

Em A Via Crucis, Clarice está hilária… Ri muito mesmo! Todas as histórias são ótimas… Às vezes chega a ser um metalivro, um livro que fala do livro… “Às vezes me dá enjoo de gente. Depois passa e fico de novo curiosa e atenta”.

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A Mulher de Trinta Anos – Honoré de Balzac

Eu li “A mulher de trinta anos”, aos 13! E já lá entendia, bem precoce, o que estava dizendo Balzac. Resolvi reler agora para comentar nesse meu blog sub-literário e também porque acabei de entrar no 30 e estou preste a me casar.

Um desavisado poderia me alertar: “não leias Balzac às vésperas do casamento, porque o noivo poderá ser abandonado no altar”. Não é para tanto, mas de fato nosso amigo Honoré faz afirmações um tanto desanimadoras do casamento como: “casamento é uma prostituição legalizada” ou “Casada, ela deixa de se pertencer, é a rainha e a escrava do lar”. Algo de submissão e sofrimento. Mas, devemos localizar o romance histórico (século XIX) e deixarmos lá, em seu devido lugar, muito embora há algumas semelhanças nos dias de hoje. A evolução social não é absoluta!

O que mais fica desse livro e que gerou a expressão mulher balzaquiana, são suas descrições sobre a mulher de 30. No capítulo em que Julie está com 30 anos, casada, infeliz, porém segura de si, ele faz um verdadeiro tratado sobre a mulher nessa idade (o que me faz desconfiar que Balzac era uma mulher travestido de homem) – brincadeiras ao largo, Balzac parecia entender muito bem da alma feminina em frases como:

‘Uma mulher de trinta anos tem atrativos irresistíveis. A mulher jovem tem muitas ilusões, muita inexperiência. Uma nos instrui, a outra quer tudo aprender e acredita ter dito tudo despindo o vestido”.

Sabemos que essa não é a obra prima de Balzac. Aliás sua história é muito confusa. Ele foi escritor mais por teimosia do que por talento, mas conseguiu escrever pérolas como “Ilusões Perdidas”, que pretendo comentar aqui futuramente.

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Ensaio Sobre a Cegueira – José Saramago

Acabo de ler “Ensaio Sobre a Cegueira” de José Saramago… Interessante! Essa foi uma das poucas vezes que vi o filme antes de ler o livro. Vi o filme na época em que lançou em 2008, se não me engano. Queria ler o livro, mas à época tinha outras prioridades. Enfim, como toda adaptação o filme deixa muito a desejar. Mas eu quero falar do livro.

Apesar de ser um autor português, Saramago não usava aquele português arcaico que mais parece outra língua que não o nosso português! Muita gente diz que para ler Saramago precisa de concentração porque o autor não usa pontos de interrogação e exclamação, somente pontos e vírgulas e intercala muito, mas o texto é tão cadenciado que você não se perde. É muito bem construído.

Sem falar que ele não dá nome aos personagens. Trata-os pela sua principal características: o menino estrábico, a rapariga de óculos escuros, o médico, a mulher do médico, o primeiro cego, a mulher do primeiro cego, o ladrão, o cachorro das lágrimas e assim vai… Não há um nome sequer no livro. Uma identificação! E o próprio autor fala: “para que servem os nomes, quando se é cego?”. Interessante observar que na sociedade geralmente não se trata o cego pelo nome, mas como “cego” ou “ceguinho”.

Minha intenção, quando falo dos livros que leio, não é fazer resumos, porque resumos tem aos montes na internet e nem fazer críticas literárias porque a internet também está cheia desses ‘especialistas’. Só quero dar minha impressão simplória…

Quanto a falta de um dos cinco sentidos pode alterar nossa condição humana (lembrei de Hannah Arendt)? Se perdermos o tato, nos cortaríamos, andaríamos queimados por aí? Se perdemos a audição, seríamos pegos de assalto pelos perigos que vêm por trás? Se perdermos o paladar, deixaríamos de distinguir os sabores? Se perdermos o olfato, não sentiríamos o cheiro de um perigo iminente? Perder qualquer uma dessas “antenas” nos prejudicaria e muito, mas e a visão?

Saramago fez essa viagem no livro e ele foi tão visceral que senti como se ele tivesse vivido cego e por isso sabia do quanto revelaríamos nosso lado mais obscuro pela busca da sobrevivência! estupros coletivos, assassinatos por comida, são apenas alguns exemplos… A visão parece o sentido dos sentidos…

Uma frase do livro:

“…Se antes de cada ato nosso nos puséssemos a prever todas as consequências dele, a pensar nelas a sério, primeiro as imediatas, depois as prováveis, depois as possíveis, depois as imagináveis, não chegaríamos sequer a mover-nos de onde o primeiro pensamento nos tivesse feito parar”.

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Ressurreição – Tolstói

Acabei de ler “Ressurreição” de Tolstói… O romance tem como pano de fundo um enredo de amor, quer dizer, amor nem tanto, mas de uma história comum até mesmo em nossos dias de patrões ou filhos de patrões que se “satisfazem” sexualmente com as empregadas.

OK! Fui bem rasteira na primeira impressão que estou dando do livro. Na verdade o livro é muito mais que isso e a mim, me parece, que Tolstói utilizou esse enredo tão comum muito mais para falar dos conflitos internos de um homem diante da miséria de caráter com que o ser humano se apresenta, principalmente numa sociedade capitalista.

Acredito que Tolstói falou de si mesmo e de seus pensamentos quando os atribuía Nekhludov, principal personagem na trama, pois, lendo uma rápida biografia do autor, percebemos que ele mesmo passou por uma série de transformações morais (e religiosas) que o fez ter nojo da alta sociedade e dos que fazem de tudo para manter a ordem das coisas para favorecer o seu luxo e comodismo.

Ele é tão visceral em algumas passagens que vou citar uma que me impressionou bastante e que já havia pensado há algum tempo sobre isso: Ouve-se muito o discurso de familiares de doente terminais que seria melhor que o doente morresse para aliviar o seu sofrimento. Longe de julgamentos e generalizações, ele acredita que na maioria das vezes o que há por trás desse discurso é muito mais um sentimento egoísta (de se livrar do doente) do que o de solidariedade com a dor. Sinceramente, em muitos casos pode ser verdade…

Em outro momento há uma frase interessante sobre a perda dos nosso sonhos: “A gente perde a juventude quando deixa de acreditar em si e passa a acreditar nos outros”… O livro é cheio de frases de efeito que nos fazem refletir!

É um livro fantástico. Recomendo. Sou um pouco suspeita porque gosto muito de literatura russa. Mas, como não sigo lógica alguma, já estou lendo um outro autor… até a próxima!

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